A diarreia é complicação comum em pacientes em uso de dieta enteral infundida por qualquer via, ou seja, cateter nasoenteral ou gastro ou jejunostomia. Para se tratar, é importante definir o que é diarreia.
O que é diarreia?
Diarreia é a presença de mais de três episódios de evacuações de consistência diferente da habitual, num período de 24h. As fezes podem ser pastosas ou líquidas. A definição de diarreia independe do tipo de dieta que está a receber.
Causas
Ao contrário do que muitos pensam, a diarreia em pacientes com dieta enteral pode não ser causada por essa. A diarreia associada à dieta enteral é por excesso de volume infundido ou quando a fórmula é inadequada para a condição clínica do paciente.
Estas causas se subdividem em três grandes grupos listados abaixo, que basicamente são medicamentosas, relacionadas ao estado do paciente e à própria terapia nutricional.
MEDICAMENTOSAS:
- antibióticos orais ou venosos;
- laxativos osmóticos (lactulose);
- inibidores de bomba protônica (omeprazol, pantoprazol ou esomeprazol);
- antiácidos com magnésio (hidróxido de magnésio);
- suplementos orais com fósforo e potássio (xarope de cloreto de potássio, Slow K);
- procinéticos (domperidona, bromoprida, ondasentrona);
- anti-inflamatórios não esteroidais;
- betabloqueadores;
- medicamentos contendo sorbitol e manitol.
CAUSAS RELACIONADAS AO STATUS DO PACIENTE:
- desnutrição (principalmente em pacientes graves, com edema – pensar em edema de alças);
- deficiência de zinco (sobretudo em pacientes com síndromes disabsortivas ou com diarreia crônica)
- fecalomas (diarreia paradoxal);
- doenças inflamatórias intestinais – DII – (Doença de Crohn e Retocolite Ulcerativa),
- insuficiência intestinal (síndrome do intestino curto, fístulas digestivas, isquemia intestinal);
- infecções (C.dificille, parasitoses intestinais, infecções virais ou bacterianas);
- intolerâncias alimentares (sobretudo em pacientes pediátricos) à proteína do leite (APLV), ao carboidrato do leite (intolerância à lactose), ou ainda, intolerâncias alimentares específicas;
- quimioterapia ou radioterapia (pacientes oncológicos).
CAUSAS RELACIONADAS À TERAPIA NUTRICIONAL:
- volume excessivo de dieta (atentar para infusão intermitente);
- pacientes com trato gastrointestinal não funcionante recebendo dieta enteral;
- administração de volume excessivo de água concomitantemente à dieta enteral;
- dietas enterais de alta osmolaridade (semi-elementares ou as de alta densidade calórica e proteica);
- dietas enterais ou suplementos de alto teor de lipídeos (para diabéticos);
- fibras insolúveis (miscelânea de fibras);
- contaminação (manipulação de módulos ou outros insumos infundidos via cateter nasoenteral ou ostomias);
- contaminação de dietas trazidas de fora do hospital.
Tratamento
O tratamento da diarreia de paciente em uso de dieta enteral baseia-se na ampla conferência de toda a prescrição, na avaliação da atividade da doença de base e também na adequada administração da terapia nutricional. Na verdade, todos os itens devem ser feitos de forma concomitante e corrigidos assim que constatados.
Se o paciente estiver recebendo dieta enteral intermitente, deve-se retornar para a infusão contínua. A redução do volume total da dieta enteral somente é indicada caso as medidas gerais adotadas não sejam efetivas, devendo-se manter a máxima infusão que deixe o paciente confortável, em especial, quando este acredita que a dieta é a causa da diarreia. A troca para fórmula semi-elementartambém pode ser indicada, sendo a opção por fórmulas isoosmolares.
Medicamentos com potencial laxativo devem ser ajustados ou mesmo suspensos. Doenças de base, como por exemplo as doenças inflamatórias intestinais devem estar adequadamente tratadas.
No tocante à terapia nutricional, a infusão excessiva de volume, tanto de dieta e concomitantemente de água, devem ser avaliados. Um dos pontos a ser avaliado é se os cálculos das necessidades nutricionais estão adequados. Por exemplo, em pacientes obesos, usou-se o peso atual? E, em desnutridos, foi o peso desejado? Se sim, isso é superestimado.
Caso o volume ofertado esteja correto, deve-se repensar antes de reduzir ou mesmo suspender a dieta enteral. Nos casos em que há infecção pelo C.dificille, orienta-se a tratar conforme preconizado em discussão com a equipe médica assistente, ou com metronizadol ou com vancomicina oral.
O amido de milho cru por via oral ou infundido pelo cateter nasoenteral é uma opção, já que pode retardar o transito intestinal, favorecer a maior absorção de água, e tornar o bolo fecal mais pastoso. A dose sugerida é a de 10g diluídas em 50mL de água, até de 4/4horas. Em pacientes com dieta enteral, deve-se lavar o cateter com 30mL de água após a infusão.
Fibras solúveis, tal como goma guar hidrolisada, por via oral ou enteral, na dose de 5g duas vezes ao dia, podendo chegar a dose máxima de 20g/d, também são utilizadas em associação com a dieta para se retardar o transito intestinal, favorecer a maior absorção de água, e tornar o bolo fecal mais pastoso. Atenção deve ser dada a pacientes com distensão abdominal por gases.
Os probióticos são micro-organismos vivos administrados por via oral ou por cateter nasoenteral que têm a função de promover o equilíbrio da microbiota intestinal. Desta forma, estes compostos podem ser utilizados em pacientes com diarreia e que estejam utilizando antibióticos.
A loperamida é um agente antidiarreico que pode ser utilizado naqueles pacientes em que a colite pseudomembranosa, isquemia mesentérica e infecções bacterianas enteroinvasivas foram descartadas. A dose máxima preconizada é a de 16mg ao dia, devendo-se iniciar com doses menores e, progredindo conforme a tolerância do paciente.
Se nenhuma das medidas for eficiente, a dieta oral ou enteral devem ser suspensas, e a parenteral iniciada.
Pacientes com diarreia crônica podem ter níveis de zinco depletados, sendo este um mecanismo que retroalimentaria a diarreia. Portanto, este micronutriente deve ser dosado e reposto.